quinta-feira, 3 de maio de 2012

Negue.

Transponho as fases, às vezes me confundo, calo todas aquelas frases, velejo estradas e cidades.
Ponho meus pés pra andar na terra, e sinto fluindo as verdades, e me lembro que eu e você ainda somos do mundo.
Enfrento estações, de trem e de tempo. Vôo sobre um abismo entre Setembro e Janeiro onde houve chuva, sol, vento e sal.
Houve o calor dos seus braços, e o frio das angústias.
Mas não te faltou uma flor, ou uma jura num dia normal.
Você pode ter jogado tudo fora, um mimo, uma carta, um cinzeiro. Pode mudar até os cômodos da casa, pode ser que aí nada tenha lugar fixo. Mas as cenas estão gravadas nas paredes da memória, não adianta mudar de cor.
Não adianta negar que você não sente até hoje o meu amor jorrando pela escada, invadindo sua sala, morando nos seus dias.
Tenho o mapa do seu corpo transcrito nas mãos, e você ouve 33 rotações dos meus suspiros em qualquer disco.
Diz que eu não fui mulher o suficiente pra te conquistar, diz na minha cara que eu não sou ninguém pra você. Aproveita e lembra do quão mulher eu fui pra saber que naquele momento, ficar com você significava a minha devastação, e sente na pele o quão mulher eu estou sendo pra suportar a falta incabível que sinto de você.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A Imperatriz.

Moça atriz dos olhos Junhos.
Imperatriz dos meus sonhos, mergulha nas águas revoltas dos meus olhos castanhos.
Ancorei meu ar nas ondas dos teus cabelos, mares vermelhos revoltos.
Te amei muito antes dos navios negreiros alçarem vôo às estrelas,
Te fiz minha antes do amor existir,
Me fiz tua antes do primeiro anjo cair.
Traz em mãos todos os encantos
És rainha envolta no manto de fases da lua que bordei num setênio, esperando o milênio passar para enfim, te reencontrar, e chorar minha saudade em seus ombros largos, fardados de sardas, te cobrir de jaspes e desejos de madrugadas, despejar meus lábios em ti.
Ouvi dizer que nosso amor invadia até o coração dos ateus que te queimaram na fogueira por medo de crer na força que gira o mundo, e não se vê.
Sou aprendiz da eternidade, e nada sei sobre os mistérios da vida, e nem quero saber.
Nada sei sobre minhas missões ou sobre quais mundos meus pés viajarão.
Não sei se vais embora amanhã, ou se és tardia.
Apenas sei que não seguirei nenhum conselho, nenhum guia
Que me impeça de amar-te até o fim dos meus dias.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Prece ao amor.

Deu-se o encontro e eu quis duvidar que foi pela urgência de a gente se achar.
Teu olhar veio elíptico, e ao mesmo tempo nítido, me fez hesitar.
Veio feito a luz no escuro de uma noite por raiar, cintilando numa estrela, sorrateira, dizendo ser derradeira, a me encantar.
O que de mal lhe for feito caberá a mim em perfeito dom de repudiar, e afastar tudo o que possa, mesmo vindo do fraco, te atravancar.
Que os meus castos braços possam ser a firmeza que te dará a certeza de sempre vencer, tornando-te mais do que invencível.
Que as minhas forças se unam às tuas, fazendo à nossa volta um escudo brilhante, como os meus olhos quando miram os teus, para que nada de fora nos alcance diante da delicadeza do que for só nosso.
Que seu vasto abraço permaneça quente a me envolver a cada fim de dia que possamos dividir, e diante do nosso sossego, que o mais puro fogo invada o quarto e nos faça queimar em devoção, até que nosso descanso se derrame, placidamente, feito chuva de verão em nosso leito.
Que não deixemos de ter asas, que não deixemos de voar livremente, e que rasguemos os quatro ventos, mas que voemos para o mesmo destino, sendo nosso canto em alegria, trilha sonora dessa vida, e que na vida eu te dê sorte.
Que saudemos a Lua e o Sol, que sejamos nosso impulso, nosso ímpeto, e nossos princípios.
Que não tenhamos medo de perecer, para que a intensidade da entrega se embrenhe em nossos dias.

Que sejamos água e sal, para juntas formarmos um oceano.
Que sejamos duas, para juntas formarmos nós.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Milagreiro.

Um poeta sentado na pedra mais alta de uma praia sem nome, ouve as canções que um búzio lhe sussurra, olha debaixo d’água turva, uma sereia sem dono, num sono profundo, iluminada pelo reflexo do seu anel, coberta por um lençol de sal.

Um pintor sentado num bar de esquina, com os olhos embaçados de lágrima, toma café preto, numa manhã nublada, e vê o rosto de uma mulher pintado com borra no fundo da xícara, e sente cheiro de almíscar pelo ar.

Um pescador de pé, em frente ao seu leme, desembola a rede, e uma onda bate forte na madeira pintada, já descascada de seu barco, molha seus braços morenos, embaça sua vista, e derrama uma concha entreaberta em sua rede, e no avesso da concha há um espelho em azul que reflete cabelos compridos de cores fundidas, em movimento, dançando no vento, iluminados pelo brilho de uma pérola.

Um florista dorme na rede e desperta no meio da noite com o cheiro das flores, coberto de orvalho, e de chuva, e se assusta com a Lua, que brilha e ofusca sua vista, e de olhos fechados ele vê duas mãos num piano tocando uma música que roga a alguém para que o alguém não se vá.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sonho de creme.

[...]Fez-se escarlate, olhou um olhar desconcertado, deu um meio sorriso de meio segundo, trêmulo, piscou os olhos com urgência, virou-me as costas e foi, viciada nas juntas de cimento entre as pedras escuras do chão. E como num sonho, eu pude sentir nitidamente o seu abraço se revelando numa solução alcalina à base de metol, suspensa na atmosfera de um outro mundo, transferido para a caixa onde guardo meus desejos mais latentes.
Pelos seus olhos emoldurados pelas sobrancelhas tristes, eu senti seu abraço materializado em minha frente, exteriorizado pelo seu impulso ínfimo de sorrir um sorriso que esboçava apenas alguns milésimos do tempo de duração do projeto de sorriso provocado no seu interior.
Enfim, sonhos são perigosos.

sábado, 23 de julho de 2011

Tempo do Abalone.

Numa seda escrevi seu nome em aquarela vermelha.
Traguei sua boca, suas vidas, abelha rainha.
Te desenho no meu rosto com sementes de urucum, gravando seus traços nos meus.
Depois te sopro na fumaça, e você voa assim, sem rumo.
Coruja do Leste, se desfaça antes que eu feche os olhos meus de Lua
Pra te guiar nas noites frias, pelas matas, nossos mundos
Ou te perca nas tuas ruas, e me encontre em suas runas
Então olha, moça bonita: Esse anel contém o mar.
Mergulhe no abalone, e nele se reflita, que eu sustento a palavra de mulher
E me corôo com seu nome de cigana.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Lolita

Amanhã vai ter festa, estarei exposta
Vou amarrada, contrariada, e transposta
Pelo seu encanto, que tranca meu pranto e faz morigerar humor
Ai, amor
Bem que eu queria guardar meu receio em casa
Mas já que vou, rodo minha saia,
bato o pé no chão, marco presença
Vou me impregnar na sua mente,
subliminarmente
Amanhã sou vaidosa indecente
Pra te incomodar,
te amarrar contrariada, e oposta
me fundir leve, e líquida no seu mar.